quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Tens ao teu lado...


[LAKESIDE LOVE - Engagement session by Michael Radford Photography]

O namoro corre bem, dentro dos possíveis, com a probabilidade de um dia voltar a ser e a ter a mesma intensidade que existia e era partilhado ao inicio. Tens ao teu lado a pessoa com quem queres crescer, aprender e avançar. Porque haverias de te irritar com ele(a)? Porque haverias de te chatear ou ficar farta(o) das atitudes dele(a)? Tu escolheste e acolheste-o(a) na tua vida, incluindo na privada, na tua cama, nos teus braços, nos teus lábios, nos teus tempos livres e nas tuas conversas. O que tem ele(a) de tão chato ou imaturo? Queres mudar alguém que se mudou sozinho? Alguém que não cresceu no vosso jogo mas que criou as próprias regras? Alguém que se separou da tua mão e fez-se à vida independente da tua, passando tu mesma(o) a seres apenas uma foda na cama, uma personagem de fundo? Com o teu consentimento, ao longo do tempo acostumaste-te à sua presença na tua vida "atarefada". Ele(a) parado(a) no tempo, enquanto tu lutas um pouco todos os dias para ele mudar no que se tornou, na pessoa feia que se transforma e se perde da Vida.
Porque refilas? Porque desabafas? Porque te chateias com ele(a) e te incomodas? Ninguém tem obrigações, nem direitos em ser ou fazer o que outro quer; mas ele(a) tem para contigo, para além da relação que quer manter e em que quer viver e fazer crescer, a obrigação de acrescentar valor e amor,, de te acompanhar na demanda, tal como tu a tens para com ele(a). Pois uma relação não se faz sozinha, faz-se aos pares. Uma relação não se mantém com prendas, abraços e beijinhos; Se for para isso, dás-los à tua mãe!
Não te habitues a ele(a). Não te habitues aos hábitos dele(a). Não te habitues, se ele tiver deixado de ser o bom e incrível que já foi. Não discutas. Espera, já só comunicam com gritos e berros? Com discussões por "tudo e por nada"? Não, não é comunicar, é inventar desculpas para ainda estarem juntos, é interporem opiniões diversas, de extremidades opostas do globo, sem qualquer consentimento entre ambos. Isso não é dialogar, não é ouvir, não é tentar compreender ou aceitar a forma de ser ou de pensar do outro; isso é ódio acumulado e da força do hábito de viverem juntos. Muitos estão juntos porque não querem quebrar o hábito de anos de namoro ou casamento. Mas lembra-te: Quem namora desnamora. E é tão fácil dizer adeus. Tão fácil sair da rotina horrível em que te deixaste enterrar por ele(a).
Dizia-me um senhor de idade avançada (um velhote) de que 2 anos de namoro são 2 meses, e 2 meses de namoro são 2 dias. Espreme as memórias, o dia a dia, e a conta-gotas irás perceber que a pessoa que tens ao teu lado já não deita o mesmo sabor e o mesmo perfume que tanto gostavas. Uma pessoa que cresce verdadeiramente aperfeiçoa-se, deixa de ser "intrigante" e "misteriosa" para passar a ser um algodão que dá vontade de abraçar, onde podemos desabafar sobre o dia do hoje e do amanhã, sobre as inseguranças, sobre as doenças, ideias, opiniões... partilhar uma constipação ou valorizarmos e simpatizarmos com uma dor de dentes ou uma dor de estômago.
Uma relação é algo que deve ser encarado de frente, com seriedade, com regras estipuladas, com cedências de ambos, com partilha de actividades e responsabilidades. Uma relação é mais complexo e exigente do que os namoros de meninos e meninas. Uma relação é mais do que um "mãos-dadas", um jantar romântico, umas flores ou um filme. Uma relação é um estudo, é partilha.

Olha para ele(a). Se neste momento tivessem um filho, achas que ele seria um bom pai, uma boa mãe? Faz ainda o seguinte teste: durante 1 semana, imagina-te grávida, ou imagina-a grávida, e tenta perceber que tipo de pessoa seria nessa situação. Ainda são novos? Dá-lhe um tempo, ainda estão a crescer.
Deitas-te na cama que fizeste. Deitaste-te por tua escolha, e não pela de mais ninguém. Estás com ele(a) porque queres, não és obrigada(o) a aturar ou a permanecer ao seu lado só porque te sentes mal, porque terás pena ou a tua familia -- ou a dele --  te pede ou te exigiu. Cada um tem a sua vida e se ele(a) não quer fazer uma contigo, em conjunto, não percas mais tempo a tentar enganar o teu coração, as tua emoções, a matar a tua personalidade e a travar a tua maturidade e intelectualidade. Todos sofremos. Todos morremos. Faz parte da vida. Se ele for inteligente, irá crescer; Se ele não tiver paciência para aprender, ficará na escuridão do conhecimento. Uma pessoa que se esforça, tenta fazer melhor, uma pessoa que não se incomoda, dá desculpas. Uma pessoa quando quer realmente uma coisa, vai atrás!
Nunca te esqueças: Tens ao teu lado aquilo que exiges de ti mesma(o)! Se não exiges de ti, se não te sentes mulher ou homem, se precisas que os outros te incentivem, que te façam sentir feliz, então significa que ainda tens que aprender que a tua satisfação não vem dos outros, mas de ti. Crescemos na nossa cabeça, não na cabeça, e da opinião, dos outros.
Apaixona-te por alguém que te deseje na mesma intensidade com que a desejas a ela. Não és complicada(o) e ele também não. Precisas de ser tocada nos sítios certos e estimulada da maneira mais interessante. Somos humanos, evoluímos de estímulos, aprendemos com eles, e vivemos deles. Se ele(a) não tem nos olhos o mesmo brilho de quando te via ao fundo da rua, do corredor ou ao portão da escola, do trabalho, todas as manhãs ao acordar, a vossa "vida" perdeu-o e precisas de o re-encontrar com uma conversa essencial, sem permissão de ser adiada ou interrompida. Um jantar num restaurante calmo costuma resultar e é também à mesa que se discutem os negócios mais importantes.
Permanecer ao lado dele(a) por conveniência não é o mais correcto. Até porque pode ser ele quem está a sofrer em silêncio para com as tuas atitudes e decisões. Contudo, se estás a ler isto, significa que és tu quem estás a sofrer e nesse caso eu recomendo-te a ler "Mulheres Inteligentes, Relações Saudáveis" de Augusto Cury (livro na FNAC), e o "O Pai de que ela precisa" de Dr. Kevin Leman (livro na FNAC).

Para dar valor a um sorriso genuíno e distingui-lo dos falsos, é preciso conhecer de cor a dor, a amargura, a tristeza, a solidão, o choro, a depressão, a saudade e o frio. Não tenhas medo da separação. O luto serve para aprenderes a cair e a levantar, para entranhares em ti a traição de ti própria e o frio que ele(a) te tem proporcionado.
Fico sobretudo feliz, por perceber que nunca estive errado, mas agarrado à escolha errada, tu.
Em: Vou-te contar uma ou duas coisas...

Não esperes, não fujas, não tenhas medo nem vergonha.
Senta-te, olha-me, fala-me, partilha.
Porque quando um dia quiseres estar ao meu lado... já eu faço alguém feliz todos os dias.
Em: Não esperes...


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quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

A diversidade cultural pode tanto dar como tirar...


O "Ocidente" levou ao mundo a revolução industrial, depois do "Renascimento", do "Iluminismo", do "Humanismo", e do "Liberalismo".
Napoleão Bonaparte acrescentou um "plano nacional de saúde" e a escolaridade "obrigatória" para todas as crianças.

Aperfeiçoámos e desenvolvemos novas técnicas nas mais diversas áreas: Arte, Filosofia, Ciência, Geometria e a Aritmética, recriando aos poucos uma nova biblioteca da Alexandria, com a ajuda da família Medicis.
Espalhámos a nossa ideia pelo mundo com a ajuda de uma cruz às costas, e tudo o que fizemos com este conhecimento, foi a conquista do espaço, meia dúzia de vacinas, nano tecnologias e a ideia de que as pessoas precisam de consumir para se sentirem parte da sociedade. Uma sociedade cujo o único objectivo é ter dinheiro e não conhecimento.

A Etnologia mostra-nos e explica-nos, que as sociedades diferenciam-se entre si. Pense nas diferenças culturais que e existem na Europa, de Norte a Sul, de Este a Oeste. É mais do que óbvio de que partilhamos um mentalidade ou regras cívicas, por entre todos os países da União Europeia, mas somos no entanto muito diferentes. Os valores em Portugal não são os mesmos que em Inglaterra ou Alemanha, porque somos um país pobre e com uma incapacidade tecnológica militar e verbas científicas com o qual nos possamos comparar intelectualmente ou tecnologicamente. Relativamente à America, como se costumava muito dizer na década de 1990 a 2000, estamos atrasados 20 anos. Contudo, comparativamente à informatização de Inglaterra ou França, os serviços públicos estão apenas 1 década ou talvez nem isso. A nossa sociedade, Portuguesa, é madura, não está atrasada verdadeiramente no sentido literal. Todas as sociedades, mesmo a dos índios, está actual. A história em volta da europa, esteve mais vezes e mais tempo parada no tempo, a nível filosófico e tecnológico, que quase se equipara aos tempos babilónicos. A nossa evolução não é gradual, é aos saltos, aos pulos. Não é tão fácil como subir umas escadas.
Desta forma, podemos perceber que a sociedade é moldada. Costuma-se até dizer que estamos "Americanizados". Sofremos de uma lavagem cerebral e ninguém se dá conta; Ainda assim, falam mal de Joseph Gobles e Adolf Hitler, as mentes por de trás da grande máquina manipuladora que foi adquirida, trabalhada e aperfeiçoada pelos americanos. Sendo mesmo assim, Edward Bernays, o pai da propaganda moderna, que fez a sociedade comprar um produto porque isso a faria sentir-se bem.
Ver mais em: Ethos (2011)

O nosso planeta é governado pelo Ocidente, que manipula todas as outras sociedades/culturas através de um "ambiente" de escravidão, como o caso da China. Somos controlados pelo "Fast-Fashion" e pelo design sublime da Apple; O luxo, o grumet, o sexual.
O único objectivo das civilizações "modernas", "industrializadas" e "desenvolvidas", é dar a ideia às pessoas que as compõem, que comprar é algo importante e indispensável para sermos felizes.

"A erva é sempre mais verde do outro lado da cerca!"

E por esta mesma razão, estas ideias, vendidas através de todos os mecanismos de comunicação social, fazem-nos crer que:
Aceitar a junção de culturas é algo positivo.
Que aceitar a homogeneidade de uma sociedade, é algo bom.
Que aceitar a destruição de barreiras culturais, é positivo para todos, incluindo os países em questão.
Que aceitar a forma de vida dos outros países, é algo "saudável".
Mas há sempre alguém que sai a perder com tudo isto! O país que aceita uma troca, por assim dizer, da sua cultura "pobre" por uma cultura mais "rica", irá perder a sua estrutura, a sua origem, as suas cartas na manga. É isso que faz cada sociedade única. É a partilha de conhecimento, de ideias novas e formas diferentes de ver ou resolver o mesmo problema. Se não existirem diferenças, não existem coisas novas. Porque como todos sabem, a competitividade, gera novas ideias/inovações. Obriga ambas as partes, sejam empresas ou pessoas, a melhorarem-se mutuamente. Se não existirem diferenças, como as á até na escrita, de autor para autor, de músico para músico, tudo aquilo que nos satisfaz seria extremamente monótono.

"A ignorância cria o caos, não o conhecimento."
Lucy em Lucy (2014)

A diversidade cultural pode tanto dar como tirar. Porque uma coisa é explorar ideias que funcionam, e outra é homogeneizar culturas.
"Raça e História" - Claude Lévi-Strauss [Nova Vega, Passagens]

sábado, 28 de novembro de 2015

Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [42]

[blood in Pinterest ]

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Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [41]

Joana ouviu um carro passar junto á parede do armazém e desaparecer com a distância. As câmaras estavam ligadas e gravavam toda a cena. Inclinou-se para a frente, folgando a fita-cola Gaffer entre a as suas costas e o encosto. Percebeu nesse momento que todo aquele aparente esforço por parte do assassino para a aprender, tinha sido apenas encenado para criar um momento de suspense em frente às câmaras. Ele tinha tudo planeado para elas, e o guião que tinha começado pelo portão da fábrica acabaria com uma delas morta, pois a sua amiga parecia começar a ganhar consciência. Tudo o que aconteceria depois de se levantar daquela cadeira, seria improviso para a mente do psicopata.
A amiga acordara. Apercebia-se de que estava nua pelo frio que sentia nas partes mais baixas e sensíveis do seu corpo. Um pequeno beliscão apareceu tão depressa como um piscar de olhos. Sem conseguir levantar a cabeça, forçou o olhar para o seu braço esquerdo; Estava ligada por tubos a soros que dificultavam os movimentos do corpo.
-- Joana? -- balbuciou a rapariga pálida deitada na mesa, reconhecendo um rosto em movimento brusco. Joana permanecia em silêncio quanto á pergunta, mas grunhia no esforço que fazia para se tentar livrar da fita-cola cinzenta. Deu-se a depilação de um braço e de uns quantos cabelos. Gritou com dores e caiu sobre a mesa, de cara na perna da inimiga.
-- Joana? És tu? O que se passa? -- questionou de novo a rapariga. Não havia resposta na língua, apenas dentes que se fechavam em serrilha uns nos outros, com um nervosismo demoníaco e uma ansiedade fervilhante nas mãos de corpo firme e passadas decididas.
Joana pegou numa faça e aproximou-se da cabeça da "amiga". A tortura física começaria com pequenos passos. Primeiro a desfiguração do charme do pré-cadáver, e depois a matança definitiva.
Cabelo cortado, sobrancelhas arrancadas com fita-cola, bochechas esmurradas, lábios pisados, mamas amarradas e dedos torcidos.
Surgia a verdade, tortura a tortura: A amiga de Joana dormira com o seu pai, e no dia do acidente a mãe descobrira tudo e a caminha da escola para confrontar a rapariga, e com o stress e ódio acumulados pelos dias de dúvida, atropelou o gato, partindo-lhe uma pata, e estampando-se contra um camião por não ter parado num STOP.
Depois da morte, voltou a encontrar-se com o pai de Joana, até que este acabou tudo com ela, acabando ao lado do seu ex-namorado.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [41]


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Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [40]

A lixívia ardia-lhe nas narinas, provocando uma ligeira dor de cabeça que deixava os pêlos do braço levantados. O telemóvel vibrou no bolso, num zumbido que a assustou sem esperar. Era um cronómetro que exigia um código para desligar. Olhou para o assassino à sua frente e mais ao fundo da fábrica, vazia, viu uns plásticos formar paredes semi-transparentes de cor avermelhada. Pensou nos perigos que poderia correr e digitou o código de desactivação nos poucos segundos que lhe restava dos 60 que lhe eram concedidos. Era uma maneira de a manter segura ou de o condenar caso lhe acontecesse alguma coisa.
Aproximaram-se do plástico, e já a alguma distância, pôde distinguir o que parecia ser uma mesa com alguém deitado sobre ela. Ele entrou á sua frente e ela paralisou, ali mesmo, à entrada daquela sala improvisada. Uma câmara apontava para o corpo de uma rapariga da sua idade, ainda com roupas, e ao seu lado, quase como mesinha de cabeceira: uma mesa de material cirúrgico que proporcionava à vitima uma dose de calmantes para adormecer.
-- O QUE ESTÁS A FAZER!? -- gritou em pânico.
-- Não querias experimentar? Não querias que eu te mostrasse? Não querias testemunhar o prazer de tirar a vida de alguém com as tuas próprias mãos?
-- EU NÃO PEDI NADA DISTO! -- continuou, apontando para a rapariga que parecia acordar incomodada com os gritos histéricos. -- É MINHA AMIGA!
-- E? -- sorriu.
-- E!? - SOLTA-A! -- olhou-o. - JÁ! - exigiu, debruçando-se sobre os pulsos presos da amiga, já mais para lá do que para cá, num nervosismo que lhe descontrolava os dedos.
-- PÁRA! -- gritou de volta, agarrando-lhe nos pulsos. Atou-a a uma cadeira, deu-lhe uma mordaça e enquadrou-a no plano de uma segunda câmara. O espectáculo iria começar.

De olhos assustados, testemunhava o despir da sua amiga através de tesouras e facas, que rasgavam as calças e o sutien como uma faça quente em manteiga. As lágrimas apareceram finalmente no rosto avermelhado. Ele olhou para ela e sorriu, momentos antes de deixar o quase cadáver desprovido de roupa.
-- Lembraste do dia em que morreu a tua mãe e lhe  telefonaste a pedir para ir contigo ao funeral? Porque ela era a tua melhor amiga? E ela foi, só porque sabia que o teu ex-namorado ia também e comeram-se mesmo atrás da lápide, a poucos metros atrás de ti, enquanto lidavas com a angústia e sofrimento naquele momento em que vias o caixão sair do carro e pintar para sempre a visão macabra que um filho da tua idade jamais deveria ver. Foi ela quem te roubou o namorado. A alegria, as forças. Que te abandonou.
Ela olhou para ele com espanto e uma dor profunda em volta dos olhos de testa franzida. Percebeu que o questionava.
-- Como é que eu sei tudo isto? Eu estava lá. A tua mãe era uma grande amiga e ensinou tudo o que sei hoje sobre mulheres, sobre pessoas. Era uma psiquiatra incrivelmente talentosa. Mas ela? -- apontou para a rapariga despida. -- tirou-te tudo e nada te deu, no momento em que mais precisavas. Se desaparecer pelas minhas mãos, ninguém dará com ela. Queres saber como é? Toma. -- ofereceu-lhe a faca, mesmo sabendo que ainda estava amarrada. -- Não queres? Tudo bem. -- poisou a lâmina em cima da mesa e tirou o avental de plástico.
O seu telemóvel tocou e atendeu a chamada com um largo sorriso. Confirmou ir a algum lugar e olhou para Joana.
-- Já volto. Tenho de ir tratar de um assunto. -- piscou o olho.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Um elo perdido dos sentimentos...


Constrói reinos à sombra de conquistas, amontoando carcaças e inundando rios com o sangue dos teus e o dos outros. A causa alastra-se como um fogo de labaredas titeritadas pelo vento, substituindo a lua e as boas maneiras no toque das portas velhas. Fazem-se convidados e cultivam as suas sementes em virgens de uma beleza e inocência pura, que os seus anjos da guarda, divinos, se aterrorizam e gelam com tamanha barbaridade cometida por todo o corpo das suas santas prometidas. Não são guerreiros, nem homens, são monstros! Criaturas obscenas que fariam o estômago do próprio Diabo se revirar.
Consomem e são consumidos pela febre delirante de causas não naturais, de origem humana, de mãos pintadas de ouro e o coração encarcerado num reino que alcança o horizonte e engole o sol. Se descer dos céus, ninguém lhe dará tempo para os sermões e os dilúvios serão só mais uma enchente nos rios.
Secam as sementes, cozem o pão e matam um porco com vinho de uma pipa mais antiga que a própria casa, que a própria mesa o chão que pisam. Não existem portas nem portões que os sustenham na marcha virada à terra prometida.
São formigas adaptadas a mundos pós-apocalípticos. Árvores que se entranham na terra mais verde e bichos que furam as pedras mais duras. São um veneno incurável, que bombeia da terra a água do mundo e lhe injecta o resultado das suas inteligentes entranhas. O progresso, fomentado no tacto do verme que engrossa no útero da fêmea, carece de espírito que só pode ser preenchido com objectos de sons e cores do outro mundo. Do mundo do além, para lá da compreensão total e absoluta de quem o manipula. Já não à utensílios de pedra e a era do bronze à muito se derreteu e reciclou, para dar origem a uma nova fornalha de técnicas apoiadas pelo tédio e malandrismo.

Aguardo ansiosamente o momento em que todas as gerações que precederam Adão e Eva, se tornem numa só Era, e tudo se dissipe, sem estrondo, sem cheiro, sem vestígios da nossa existência. Um elo perdido da evolução.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Um sonho persegue-nos, nasce connosco...

[Soldiers going to battle - Pinterest]

Two Steps From Hell - Moving Mountains
When you see the huge enemy armada coming out of the fog...

A cavalaria despedaçava a erva e o orvalho com a luz da lua a seus pés. A marcha conquistava a orla da floresta onde tinham montado acampamento para flanquear em surpresa a primeira vaga que desembarcaria naquela fatídica manhã de remos e água gelada a escorrer-lhes nos corpos.
Na cabeça do plutão surgiu Afonso Henriques, um promissor cavaleiro e futuro rei de "Portu Gal". O número de elementos da sua unidade de ataque, era inferior às ajudas dadas pelos espanhóis, naquela zona longínqua do reino de Leão e Castela, invadida por muçulmanos.
Ao longe, já a cobrir a praia como formigas famintas, desembarcavam os invasores, conquistando passada a passada, espalhando o seu odor e a sua lingua pelo ar. Contava-se uma inferioridade de cinco para um, contra a coligação de Portugueses e Espanhóis. Estes últimos quase desistiram de um ataque, optando pela diplomacia, mas Afonso não estava preparado para dar de mão beijada as terras de seu pai a meio bando de homens grosseiros que vinham da outra ponta do oceano. Se queriam um pedaço da Peninsula Ibérica, teriam de passar por cima do seu cadáver.
-- Henrique, não temos soldados suficientes! Sê razoável! -- aconselhou-o seu grande amigo de infância.
-- Prefiro morrer pelo que acredito! Morrer por um sonho! A fugir como um cão cobarde de rabo entre as pernas.
-- Ao menos espera por eles! -- pediu.
-- Não te preocupes meu belo amigo, nós chegamos para todos eles! Vê! Vê como eles se arrastam de cansaço por esta terra bonita! O que dirão os teus filhos e os filhos dos teus filhos? Esta terra é nossa, foi-nos dada por Deus, por meu pai. Acredita em mim, hoje, nós vamos fazer história! -- desembainhou a espada grande e pesada com um só gesto e apontou para a horda de homens já vencidos pelo cansaço. -- Pelo futuro dos nossos filhos! -- brindou de espada no alto, incentivando o guerreiro no peito de todos os homens que o seguiram durante dias até àquele ponto.
A cavalaria e infantaria de Afonso Henriques, rasgou o ar num arrepiar de rugidos guerreiros que se fizeram ouvir poucos minutos depois nos ouvidos dos muçulmanos ainda habituados ao som da rebentação das ondas e do remos baterem na água.
-- "Vejo neste país um futuro invejável! Só temos de ir lá e conquistá-lo!" -- pensou o primeiro herói de Portugal.


Um sonho persegue-nos, nasce connosco, bem no fundo da nossa mente. Existe por trás de cada ideia, cada palavra, cada sentimento e surge num único lugar: na saudade de cada português.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Somos a criatura que melhor combate o tédio...

[Gardening - Bibury, England August]

O homem vive única e exclusivamente para satisfazer o tédio de viver. Não há nada de relevante em se ser vivo e em estar vivo. Sobreviver é por si só a necessidade de não sucumbir ao tédio. Tanto a caça como a fuga são as raízes que sustentam a árvore da nossa consciência que não quer estar aborrecida e parada. A consciência dá então origem ao interesse pelo que nos rodeia, às perguntas sem resposta. Uma consciência, a nossa, que transcende a capacidade de pensar dos animais de forma abstracta. E mesmo que lhes seja ensinado, aos animais, os números e as cores, em nada isso muda a sua vida enfadonha; Torna até pior, pois agora os animais "educados" fazem ainda mais perguntas, pois compreendem ligeiramente melhor o que vêm e talvez até o que sentem.
Provando assim que o ser humano, tal como os animais, não têm qualquer tipo de plano divino ou astral nesta vida, neste planeta ou neste universo.
O tédio evoluiu-nos e continua a fazer-nos evoluir, pois é nos momentos mais parados da nossa vida, como a ida à casa de banho ou durante o sono, que o cérebro tem tempo e processamento suficientemente reduzido para trabalhar ideias, conversas, imagens, sons e cheiros com mais atenção e pormenor.
"Comecemos pelo principio. No principio, havia um Paraíso, onde o homem vivia sozinho. Havia apenas um único inconveniente, comum a todos os paraísos terrestres, celestes e subterrâneos: Adão aborrecia-se de morte, desfiando lamentos ao bom Deus. Um dia, estava ele a dormitar, foi-lhe retirado um osso excedentário, do qual se fez uma mulher para seu prazer, distração e companhia. Porém, a felicidade não durou muito tempo."
A Génese Natural: Sobre a situação singular dos machos na humanidade - Asger Jorn [pág. 35]

"Que a vida humana deve ser algum tipo de erro está suficientemente provado pela simples observação de que o homem é um conjunto de necessidades que dificilmente são satisfeitas; que a sua satisfação nada consegue a não ser uma situação indolor em que apenas cede ao tédio; e que o tédio é uma prova directa de que a existência em si mesma não tem valor, pois o tédio mais não é que a sensação do vazio da existência. Porque se a vida, por cujo desejo consiste a nossa essência e existência, possuísse em si um valor positivo e um conteúdo real, não existiria o tédio: a mera existência encher-nos-ia e satisfazer-nos-ia. Da forma como as coisas são, não temos prazer na existência a não ser quando estamos a lutar por alguma coisa.
Sobre o Sofrimento do Mundo - Schopenhauer [pág. 25 .5]

Inclui-se neste pensamento, de uma perspectiva macro planetária, pode-se ver que o mundo não é movido apenas pelo dinheiro mas pelo tédio de ideias milionárias ou de soluções. O dinheiro é apenas aquilo que surge no fim da produção, é o que mantém o cérebro activo, sempre apontado para um objectivo e não para um prado verde sem tarefas ou obrigações que rapidamente nos levariam à loucura e ao tédio.
Cada um de nós tem a sua personalidade, desenvolvida pelas suas experiências, sempre diferente, mesmo que ligeiramente, de cada um dos indivíduos da nossa familia mais próxima (pai, mãe, irmãos, etc), mas como familia temos uma personalidade que também partilhamos. Temos ideias que desenvolvemos e esmiuçamos em conversas à hora do almoço/jantar ou no carro em viagem. Mas, na nossa rua também existem outras familias, e se nos dermos bem com os vizinhos, começaremos a notar que partilhamos opiniões similares, talvez um pouco diferentes da rua vizinha. A nossa rua partilha uma aldeia com outras ruas, ou uma vila, ou até uma cidade, e como aldeia, vila ou cidade, haverão ideias e opiniões que partilhemos, apesar de todos nós termos localizações geográficas e meio-ambiente familiar diferente, com histórias diferentes.
É então que entram as juntas de freguesia, os concelhos e os distritos, que englobam um conjunto maior de pessoas, de ideias e opiniões (obviamente), englobando tudo isso num só país, que também ele se engloba num conjunto de estados da União Europeia.
Cada individuo trabalha para combater o tédio; Assim como cada familia, cada rua, cada aldeia, cada vila e cidade, cada distrito e país.

"Existem muito mais cultura humanas do que raças humanas, uma vez que umas se contam por milhares e outras por unidades: duas culturas elaboradas por homens pertencentes à mesma raça podem diferir tanto ou mais que duas culturas de grupos radicalmente afastados."
Raça e história - Claude Lévi-Strauss [pág. 7]


Nós somos o resultado do combate ao tédio. Nós somos o produto de uma evolução que nos provocou o crescimento cerebral, de perguntas sem resposta e de provas sem fundamentos (como o fogo queima? Como a água engelha os dedos? Como os pêlos crescem?).
O tédio desenvolve, a menos que a necessidade de sair desse estado seja menor do que a vontade de fazer alguma coisa.

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O sofrimento do mundo...

domingo, 27 de setembro de 2015

Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [40]


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Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [39]

-- Já sabes onde é a minha verdadeira casa, está lá esta Quinta-Feira às 6h. Vou-te dar o que tanto queres.
Ela de sorriso largo na cara, beijou-o na face e viu-o sair sem dizer mais nada, sem nunca a olhar nos olhos. Saira simplesmente, focado e decidido.
Sentiu as borboletas no estômago com tanta ansiedade, desejando que já fosse Quinta-Feira, que não dormiu nessa noite. Entrara na DeepWeb para fazer alguma pesquisa e saiu à rua para poder sentir as pessoas. Nenhuma delas sabia que podia aparecer morta no dia seguinte, de garganta degolada ou deixada paralisada num canto escuro de uma floresta, violada. Atraída pelo perfume ou pela conversa de caça.

Quinta-Feira, 5h40. Estacionou o carro dentro da propriedade e dirigiu-se ao portão da pequena fábrica antiga. Aproximou-se devagar, levou a mão à pega do portão em metal e tentou-o abrir. Cheirava-lhe a lixívia e a terra molhada. No céu antecedia um fumo espesso. Ele estava lá.
De repente, mesmo á frente dos seus olhos e do seu ouvido, que encostara para ouvir, rugiu-lhe um som metálico seguido de uma força raspar-lhe quase a cara. Ele abrira o portão com tamanha força e rapidez que ela se acagouçou de medo. Paralisada, viu a figura do psicopata assassino com quem decidira brincar aos papás e às mamãs. Era melhor ganhar coragem ou fugir dali de uma vez.
-- Estávamos à tua espera. -- sorriu-lhe. -- Entra, vamos começar?



quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Não sou histórias repetidas...


Sabem aquelas histórias, tristes da vossa vida, ou as loucuras que já fizeram, que contam vezes e vezes sem conta a todas as pessoas que conhecem? Eu tenho uma radio-cassete cheia dessas histórias.
Conto-as várias vezes, tanta vez, que já lhes tirei os pequenos pormenores. É uma palestra tão monotonamente decorada que estou tão farto de repetir que nem sequer me apercebo que só hoje as repeti umas duas vezes.
Talvez seja só eu. Talvez seja de mim. Uma tentativa atrás da outra, na esperança de me ligar a alguém que me compreenda, ou só mesmo que me ouça. Quero ser ouvido? Ou quero que tenham pena de mim? E aprenderem comigo, não era melhor? Falsamente é nisso que acredito; Que as minhas histórias são experiências. Mas estas experiências não têm grande valor na verdade. Ajudaram-me a crescer, é certo, mas hoje são só um disco riscado que ouço e conto sem pensar, porque me habituei à infelicidade do que sou enquanto história de mim mesmo.
Eu não quero ter cassetes, não quero ter histórias destas, quero aventuras! Quero coisas únicas, algo que ensine, que faça rir, que entretenha. Quero contar os meus fracassos aos meus filhos para que eles aprendam através de mim, mas que estes fracassos não façam só parte daquilo que sou.

Eu não sou só esta tristeza.
Eu não sou só estes desamores e sofrimentos.
Eu não sou apenas um jovem amargurado.
Eu tenho incertezas como todos os outros, mas não vivo apenas delas.
Eu sou mais do todas essas cassetes decoradas. Sou uma palestra interessante, acredito.
Sou interessado em aprender, em lidar com crianças, em cozinhar, em amar, em ouvir, em argumentar, em escrever, em fantasiar, e em mil e muitas coisas.

Quero deixar de contar as histórias de experiências falhadas, pois tudo o que sou aos meus olhos não passam de 5/6 contos que comandam as minhas acções. Sou mais do que isso. Muito mais...
Sou capaz de tanta coisa e foco-me apenas nas que me deixaram triste ou frustado. De qualquer forma fico feliz por mim, porque sou capaz de ver o problema de várias perspectivas. De desmontar a ideia e trabalhar em algo diferente. De criar um argumento melhor, solidificar a minha opinião ou emparedar um gosto caricato.

"Who are you? You are not you'r age, color, ethnicity. You'r not possessions, hobbies, believes. If you take away everything you have identify your self with: family, kids, everything; What would be left? who are you?" - Pig (2011)"
Em: O sofrimento do mundo...

Mas lá no fundo, o que sou sem tudo isto? Um conjunto de sentimentos e experiências? Sou o impacto que causo no mundo? Sou o que faço e recebo dos outros?
Na realidade, espremido, não sou nada... Existo apenas na minha mente. Existo apenas nas minhas histórias. Existo num vazio sem sentido, tal como este texto.

Não sou histórias repetidas, sou os bons momentos que ainda não tive oportunidade de contar.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Sê diferente, mas consciente...



Após a tua morte deixarás o que trouxeste no teu nascimento.
Perante o teu fim irás perceber que o valor da vida não existe. Que não somos nada. Um universo sem humanos seria a mesma coisa. Na mesma belo, na mesma magnífico e incrivelmente fascinante.
Mas se estás aqui, por vontade ou não, encontra um buraco, escava um e faz dele o TEU buraco.

Ainda te lembras de quanto tempo demoraste a aprender a gatinhar? A andar? A distinguir cores? Objectos? Ou quanto tempo precisaste para atar pela primeira vez os sapatos? A escrever as letras ou o abecedário?
Talvez não te lembres, mas todos os dias foram uma luta. Todos os anos te sentias mais alto e mais capaz. Os livros e os filmes, com o tempo, começaram a ter uma história mais interessante com ideias que nunca tinhas percebido.

Por isso chora, esconde-te, grita, mas não tenhas medo, não desistas, estás a crescer. E se errares!? Se errares, aprende com eles. Re-escreve-te.
És um animal magnífico, acredites quer não. Adopta um cão ou um gato. Perceberás mais tarde, que a domesticação foi o melhor que a nossa espécie alguma vez conseguiu alcançar sem tecnologia.

Quando te voltares a sentir triste, pega num livro de receitas de doces e faz um bolo. Se correr mal, faz de novo. Lembra-te: é através das experiências que crescemos! Demoraste anos a aprender a atar os teus próprios sapatos, por isso dá-te um desconto. Estás a aprender, a crescer!

"Se caíres sete vezes, levanta-te oito."

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Se este texto te ajudar, deixa umas palavras, também eu preciso de saber que faço falta neste mundo...

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Se precisares de mim...



Abro os meus braços e deixo que caias no meu peito. Agarras-me, envolvo-te e choras. Conheces de cor a maneira como os meus braços te tocam no corpo e isso deixa-te ainda mais triste. Cais tanta vez junto de mim, que julgas já não saber fazer mais nada a não ser chorar, dos erros, e depender de mim para te limpar as lágrimas.
Dizes-me então que não és fraca e que não precisas de mim, mas não falas das coisas e isso envenena-te por dentro, destruindo a fraca confiança que tens de ti mesma.
Os abraços já não chegam; Nem as palavras, nem a minha presença, o ramo de flores e o bilhete surpresa. Isolaste do mundo. Pões uma máscara dos "dias tristes" e deixas-te ficar na cama, a soluçar entre lençóis que falsificam o calor do meu corpo e a força dos meus braços.
Uma e outra vez, perdes o equilíbrio e precisas de mim, do meu ombro, para que voltes a olhar para cima. Aprender que se caíres sete vezes te levantas oito.
Este sorriso que trago comigo, não é um gozo do teu sofrimento, é o meu amor por ti, que te espera para poder proteger e ajudar a ultrapassar mais um degrau na aventura a que chamas inferno.

Se precisares de mim, não precisas de correr à minha procura, estou mesmo ao teu lado, onde sempre estive e onde sempre estarei. Decidas o que decidir, erres o que errar ou desesperes pela dor que aperta o peito, eu estarei aqui, para te ouvir, para te apoiar, para te ajudar a crescer.

A solidão é um buraco escuro que deves aprender a controlar.

Abraça-me.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Sorri, sê feliz, ama...


A tua mãe adora deixar-me sozinho contigo na cama enquanto me conquistas a atenção com livros enfeitados de personagens mágicas. Ela prepara o pequeno almoço para os três e eu invento uma história só para ti, cheia de vida, de risos e brincadeiras. És a minha ouvinte mais apaixonada. Deliciaste a olhar para mim, super atenta, sentindo a minha voz acarinhar-te os ouvidos, e as caretas preencherem a tua sede de imaginação e brincadeira.
Os desenhos enfeitam os livros mas tu enfeitiças as nossas vidas. Roubas-nos as energias só para te pudermos acompanhar e recarregas-nos com um simples sorriso. Adoro quando sorris. A beleza que exteriorizas da tua vontade de conhecer as coisas que te rodeiam. Ajuda-nos a ser crianças de novo. Pede-me só mais uma história. Pede-me só mais uma dança com a mãe. Tu adoras ver-nos dançar e eu adoro dançar com as duas únicas mulheres com quem me casei. Todos os dias és uma aventura de perguntas espontâneas e desinibidas. Todos os dias me obrigas a crescer, a aprender, a aceitar. Todos os dias deposito o meu coração no teu presente.
A tua mãe diz que deveria ter mais calma, mas sou incapaz de te deixar com perguntas por responder, com livros de histórias por contar, com brinquedos de viva própria por personificar. És o meu recreio.

Maria? Sorri. Sê feliz. Nós amamos-te!

Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [39]


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Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [38]

Acordei com a vibração do telemóvel na mesinha de cabeceira. A luz verde piscava intermitente sinalizava uma actualização. Era um email a confirmar que a minha encomenda tinha sido entregue, em mão, com sucesso. Bastava agora esperar.
Vi as horas, calculei o tempo e enquanto me dirigia à cozinha liguei o computador. Tinha 1 hora e com um pão seco, para enganar a fome, sentei-me em frente ao teclado hackeando-lhe o computador.
As pastas de imagens e vídeos encriptados abriam-se umas atrás das outras, levando o meu software de brute-force ao limite. Eu sabia que ias ser difícil. Imprimi IPs, emails, fotografias, contas bancárias, passwords, e preparava-me agora para lhe queimar o disco até que o dono do mesmo me bateu à porta. Chegou cedo.
-- Está aberta! -- gritei. Ouvi a maçaneta e os sapatos. Virei-me para ele. Estava nervoso, furioso com os olhos carregados de medo.
-- Onde arranjaste isto? -- perguntou-me com o envelope na mão. Limitei-me a sorrir. -- Achas que vou ceder às tuas ameaças?
-- Ameaças? Não, chantagem! Tu tens algo que eu quero e eu tenho algo que tu queres.
-- Dinheiro?
-- Não sejas tolo! Tenho provas suficientes para te incriminar e ainda conseguir alguns milhares de toda esta tua trapalhada.
-- Eu sei onde moras. O percurso que fazes para o trabalho e todo o teu horário pessoal...
-- Já somos dois! -- sorri felicitando-o. -- E eu tenho toda a tua vida nesta pen. Eu desapareço e em 24h esta informação é enviada para a policia judiciária mais próxima. Por tanto, vamos negociar! -- ele ficou vermelho de raiva. -- Devo dizer que quando solicitei os teus serviços de fantasias sexuais, nunca pensei descobrir o teu mundo sombrio. Mas a verdade é que adorei cada recanto da tua casa. Tu tens as fotos, já sabes o que descobri. Raparigas mortas? É preciso ser-se doente... Mas eu não sou muito diferente de ti. Não me falta a beleza, o charme, o dinheiro, a inteligência... mas falta-me algo que tu tens: Coragem para matar. Eu nunca matei ninguém. Tenho um gato e é a minha única família num raio de 200km. Para ser sincera, deu-me a volta ao estômago quando acedi ao teu computador, e encontrei o histórico para os sites de snuff que visitas, os vídeos que compras e filmas... deliciaram-me a mente como uma criança a pedir um gelado do lado de da vitrina. A adrenalina que me subia pelas veias, fazia-me sentir viva. Controlar alguém pela internet é uma coisa, mas fisicamente!? Como tu o fizeste em tua casa? Quero isso. Quero controlar as pessoas. Quero matar.
-- Não sabes o que dizes!
-- Achas que tens escolha? Eu tenho os teus tomates! Eu mando na tua vida! Tomaste a decisão no momento em que entraste por aquela porta. Ensina-me a matar e sou tua! Os meus conhecimentos, as minhas fantasias, a tua segurança, a tua fantasia, o meu corpo. -- olhou para mim pensativo, com vontade de me rasgar o pescoço do corpo. -- Eu conheço muito bem esse teu olhar... apaixonei-me por ti no momento em que me apertaste o pescoço. Fiquei louca por ti quando te voltei a ver no escritório. Ajuda-me a realizar as minhas fantasias mais horríveis e nojentas, e não te desiludo. -- fiquei-me a olhar para ele à espera de uma palavra. Ele que sempre tanto jeito. -- E então? Temos acordo, amor?

Ela levantou-se, caminhou em direcção a mim, e de braços por trás do meu pescoço beijou-me. Pela primeira vez em muitos anos, não sabia o que dizer ou fazer. Ela tinha-me na mão e controlava todos os meus movimentos. O que é que eu podia fazer? Matar? 


domingo, 16 de agosto de 2015

Tornaste-te no retrato de Dorian Grey...


Isto foi o que perdeste

Apaguei o teu número de telemóvel e removi a amizade que partilhávamos no facebook. Ocultei as fotos e os teus comentários.
Vou-te esquecer, mas não tenho a certeza de quanto tempo vai demorar. Achava capaz de enfrentar esta nova vida de "solteiro" de peito bem aberto para novas experiências, mesmo que ainda estivesse de luto, mas cada vez que via as tuas fotos, tiradas sempre com o teu telemóvel e com um jubilante sorriso estranho que sempre senti dizer: "Esta não é a pessoa que me completa. Ainda ando à procura." Lá no fundo, eu até via todos esses sinais de desamores, de desinteresse que tinhas por mim, mas preferia acreditar que me amavas e que eu tinha apenas uma imaginação fértil com queda para o negativismo de tudo o que me faz feliz.
A verdade é que não querias perder muito tempo comigo, a conhecer-me, como fazem as pessoas originais. Sim, tens razão consciente, eu próprio não me deixo conhecer às vezes, quando me isolo no desconforto do silêncio, ou quando o preconceito, a dúvida e a vergonha me dominam. Mas ofereci-te o meu coração, os meus sorrisos, os meus medos e partilhei o meu choro de baba e ranho. Eras linda, e continuas a ser, não tenho culpa de teres bons genes. Mas com o tempo tornaste-te no retrato de Dorian Grey: Cada vez que olho para as tuas fotos actualizadas, todo o teu brilho se perde e a beleza desaparece. Gostava de dizer para mim próprio que ainda posso falar contigo, desabafar, ouvir os teus concelhos, mas não me conheces. Nunca quiseste.
O que custa nas relações que tive, antes e de depois de tu apareceres, é o significado que têm para mim. São relações que me abanam, que me fazem duvidar de mim e de quem amo. São memórias agri-doces que ficam, que me acompanham e me recordam com azia ou felicidade aquilo que já senti ou tive ao meu lado.
Queres saber o melhor? Estou a crescer, tal como tu. Erro e aprendo. E cada erro é pregado no meu corpo para me recordar do que fiz e do que não devo voltar a fazer. Tu foste a minha tese, o meu estudo intensivo e exaustivo da descoberta de mim próprio que não sabia que podia sair da caverna ou sair do poço. Adorava poder não conhecer todas estas amarguras pelo qual me fizeste passar, mas sem essa dor, sem esse choro, sem esses erros... nunca deixaria que o luto de nós me devorasse como me devorou. Fui solteiro com uma depressão que ostentava a tua cara de sorriso estranho, manipulador e sociopata.
Pensa positivo: Causaste um forte impacto em mim. Foram sonhos, conversas, textos, filmes, assombrados por ti durante anos. Preferia dizer que me proporcionaste mais bons momentos do que maus, mas a realidade é que tu nunca os quiseste. Tal como eu, que adoro sentir o sofrimento e o choro, adoravas sentir a inveja e o ciúme consumirem-te por dentro, como uma chama que te efervescia os sentidos e os sentimentos. Recordando a relação, até acho incrível como conseguimos estar tanto tempo juntos. Devorávamo-nos um ao outro. Eu não tinha grande futuro na altura e tu hoje muito menos. Mas... Sou feliz. Sinto-me livre, leve, despreocupado, com tempo livre a mais e sem tempo algum para preocupações. Sou um puto, mas sou feliz. No meio de todo este meu circo de horrores, sou feliz. E isso... era algo que tu nunca me conseguirias dar, porque era eu quem exigia mais dos dois, em ir mais longe. Tu? Preferiste ficar parada e com o tempo tornares-te desinteressante.

Sabes o que és? Um broche mal feito.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Este é o Alfredo...


Este é o Alfredo. Um cão de família que vive para os seus donos.
Num dia de calor, já no fim da Primavera, Alfredo saiu de casa com os seus dois amigos favoritos: Dois gémeos que vivem no seu próprio mundo, com a sua própria lingua e piadas que às vezes não fazem muito sentido.
De rabo a dar-a-dar, o Ovelhinha -- nome dado pelos irmãos -- parou para cheirar melhor um buraco na vedação do vizinho. Desconhecia tal cheiro. Pronto! Tinha o nariz estragado!
De dentro do buraco, assustando-o, surgiu um pequeno ratito muito senhor das suas piadas.
-- Ei! -- chamou a pequena bola de pêlo -- Parece que viste um rato! -- e desatou-se a rir.

Este era o Júlio; Um hamster bastante grande para a sua idade e dieta. Era o animal de estimação da filha do vizinho, a Francisca, cobiçada pelos dois irmãos, que admiravam a sua beleza sempre de longe pela vergonha.
-- O que és tu!? -- perguntou Alfredo intrigado com o tamanho da criatura engraçada.
-- Sou um hamster ora pois!
-- E o que é isso? É algo para brincar?
-- Não! -- assustou-se. -- Sou um rato. Um rato de estimação de marca cara!
-- Ahh... mas podes brincar não podes? Pareces pesado.
-- Pesado? Não! São apenas largo de ossos! -- assegurou-lhe Julio erguendo a barriga felpuda no ar, que a deixou cair de imediato, orgulhando-se das suas curvas e do seu peso.

[05/08/2015]

domingo, 2 de agosto de 2015

Até te vais burrar de medo!

[Scene from Urban Explorer]


Abre de novo a boca, e levas o outro olho inchado para casa da tua mãe. E se voltares a aparecer-me á frente, muda de passeio a menos que queiras ter um certificado de óbito inconclusivo.
Tornei-me no teu pior pesadelo. No cão de guerra a quem agitas a bandeira branca. Aqui vou eu, numa marcha suicida, apontada ao teu corpo enterrado no teu próprio desespero.
Cada vez que te olho, vejo o teu corpo tremer em arrepios de suores frios que te descem pela espinha. Aproxima-te e pode ser que tenhas sorte em sair vivo do nosso cruzamento. E quando fores para a cama à noite, é melhor vestires um segundo par de cuecas, não quero que sujes a cama cada vez que sonhares comigo.
Sim, eu sou o homem que te persegue! Eu sou o dilúvio do qual não podes fugir. Não sorrias, não tens motivos para isso! Enquanto eu existir não serás feliz! E cada vez que saíres casa, olha sempre por trás das costas! Porque te vou perseguir a vida toda de punhos fechados com vontade de te ver engasgar no teu próprio sangue!
Recorda a minha dor quando sentires os nós dos meus dedos esmagarem a máscara idiota que trazes contigo. Foi falta de amor e carinho? Não te preocupes, não apareci aqui para te educar. Não sou teu pai, sou o teu assassino! O teu psicopata pessoal, dedicado e fanático pela tua pessoa!
Colo-te às paredes do meu cérebro, numa teia de conspirações e acidentes do qual és vitima. Não tenho remorsos do meu inferno nem da faca que te degola a confiança, as palavras e te torna num gago cada vez que te olho nos olhos à distância de um grito depravado da minha existência. Sou o Alpha da matilha neurótica no qual te fechas.
Deves-te ter sentido tão sozinho, para abusares da minha fraca postura. Foste um pesadelo que se tornou num objectivo demente. Eu sou o final da história que começaste! Sou o teu fim!
Vou destruir tudo o que amas e encher a tua vida com a dor mais indiscritível que já sentiste! Fazer contigo o inimaginável e deixar-te pendurado pelo pescoço enquanto te vejo lutar na miséria do teu medo.
A minha vingança está a crescer, o teu tempo está a acabar e não te podes esconder! Vou-te apagar da história! Se queres viver, respira baixinho e não me voltes foder a cabeça!


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Lê-me, ouve-me, quando sentires a raiva controlar o teu corpo!

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Uma geração sem limites...


Antes de começar a abordar este tema, tenho de admitir que sempre critiquei os pais e esta geração de jovens que nasce com ipads, internet e telemóveis na mão.
Talvez por inveja, porque no meu tempo, na primária, não havia telemóveis, nem internet ou TV Cabo. Depois do ano 2000 só tinha telemoveis e consola de jogos quem era rico. Internet e TV Cabo? Era um luxo!

Mas como dizia: não me posso esquecer de que quando andava na primária, começaram a aparecer os primeiros Gameboys (a preto e branco com o tão famoso jogo: Pokemon) e a PlayStation. Anos mais tarde surgiu a internet e as crianças deixaram de ir jogar á bola.

A 3ª geração de Baby-Boomers, que nasceu no pós 1990 e 2000, apanharam uma sociedade já em grande desenvolvimento e mudança. Um mundo que se tornava a cada dia mais tecnológico, mais consumista.
Lembro-me do dia, num natal, quando o meu pai recebeu o 1º telemóvel, por volta do ano de 1995. Tinha eu nessa altura 5/6 anos e acabara de entrar na escola primária. O meu pai não tinha dinheiro para comprar um, mas quem lho ofereceu tinha dinheiro para comprar mais 3 ou 4.
Por isso, quem tinha acesso a um, na altura, podia-se gabar de um luxo que nem todos tinham.

Hoje os miúdos têm acesso a tecnologia que não tivemos na nossa infância e adolescência, da mesma forma proliferada e facilmente acessível como agora. E é precisamente esta facilidade e irreverência/irresponsabilidade ou imaturidade para com estas coisas com o qual crescemos a ver evoluir, como foi o caso dos Walkmans que mais tarde foram trocados por Leitores de CDs e pelos Headphones que se foram tornando mais pequenos e os computadores mais potentes e pequenos, acompanhado-os mais tarde os monitores dos mesmos, e o aparecimento de portáteis mais finos e potentes.
No entanto, esquecemos-nos de que somos também utilizadores "intensivos" -- uns mais do que outros --  destas novas tecnologias. Ninguém seria capaz de organizar e fazer a sua vida sem internet, telemóvel ou televisão, hoje em dia.
A facilidade que se tem em ver um filme, ouvir uma música, partilhar um poema ou ler uma tese é o ponto fulcral da nossa vida. Tudo gira à volta desta tecnologia. O tipo de actividade que os nossos pais da década de 60/70 tiveram é sem dúvida completamente diferente daquela que nós, dos anos 80/90 tiveram, mas somos hoje, alguns, mais capazes que os nossos pais. Hoje temos uma capacidade cerebral maior -- alguns nem por isso -- precisamente por termos recebido o estímulo de jogos mais interactivos e fáceis de manipular.
O que devemos ter em conta, é a facilidade com que as crianças que nascem neste novo mundo de interactividades de Homem-Máquina, se podem tornar viciadas a elas. É um mundo incrível que irá moldar o nosso mundo, por moldar a nossa mente, mas deve ser utilizado com precauções.

Este debate é um pouco como o Vinil vs CD. Ainda hoje em dia existem pessoas que preferem comprar em Vinil precisamente porque a tecnologia é melhor e mais fiável ao longo dos anos. Cada um tem a sua visão e opinião. Os seus prós e contras. Mas é importante percebermos que estes dois "opostos" servem cada um dos grupos alvos a que se direciona. Da mesma maneira que existe gente que prefere ler um livro num iPad e outros que preferem o toque do papel e o cheiro do livro.
Não é por serem "antiquados", mas porque existe um tipo de interacção completamente diferente. E são esses tipos de interacção, física e não apenas psicológica, que deve ser tida em conta quando os pais da criança estimularem e desenvolveram os interesses da criança.

Não posso deixar de tocar também num assunto que é a fotografia. Hoje tão facilmente acessível para todos. Numa questão de segundos, partilhamos fotos que tirámos naquele exacto momento. Já não precisamos de esperar 1 semana, ou duas, depois das férias acabarem, para as levar a um centro de fotografia e de as revelar. Poupamos milhares todos os anos.
Na altura em que estudava, já no 10º ao 12º ano, não havia sequer a ideia de tirar "selfies" a toda a hora, como testemunhei um dia na escola profissional onde estudei em que uma miúda de 16 anos, na hora do intervalo e dentro da sala, tirava uma foto a si mesma, com uns quantos colegas a estudar atrás. A facilidade e a falta de vergonha que esta nova geração emite é gritante para mim. Não perdíamos tempo com fotos a não ser que fossemos a sítios especiais, de férias, em grupo, ou viagens de estudo, de férias, o que não fosse habitual fazermos. Porquê? Porque o rolo tinha limites de fotos.
Já não sei como são as viagens de estudo destes novos jovens, mas quando ía, tentava sempre tirar algumas fotos ao local e a certos pontos de interesse ou então colocava-me em foco para ter uma "prova" de que estivera lá, para me lembrar de pequenos detalhes ou de algo que tinha gostado. Hoje provavelmente, durante toda a viagem e visita passam o tempo todo a olhar para os ecrãs, a enviar mensagens e a tirar "selfies". Acabando por tirar "fotografias" a tudo menos ao que é interessante para recordar um dia. Quando um dia tiverem filhos -- cruzes credo! espero que não!! -- estes jovens vão mostrar "fotografias" de locais lindíssimos escondidos pela sua cara a fazer caretas, com a língua de fora ou a fazerem poses, porque na altura era "cool" e todos faziam. Vão perder memórias. Vão perder emoções, sentimentos, amizades e valores sociais. Estarão para sempre ligados ao mundo mas sem realmente comunicarem com os outros de forma eficiente.

What Do People Do With Photos of Food?

A geração de hoje não enfrenta os mesmos limites que a minha geração enfrentou. Os gameboys só tinham 6/7 jogos e eram a preto e branco. Mais tarde apareceram a cores mas já se tinha de comprar jogos novos. Trocar pokémons, entre as consolas, foi uma coisa tão incrível e dispendiosa, que na minha escola primária só havia 1 ou 2 crianças, em quase 80, que tinham o cabo para o fazer.
Hoje nada tem limites. Numa questão de dias e semanas aprendem as mesmas coisas que eu levei anos a aprender, a descobrir e a pesquisar. A facilidade que têm em aprender inglês é outras das quais me deixa com uma tremenda inveja. Tive de aprender fora da escola, com a ajuda do meu pai, de alguns jogos (Magic The Gathering) e VHS da Rua Sésamo.
Passou a ser obrigatório todos terem o 9º ano, e anos mais tarde o 12º.
A minha geração viveu um tempo de ignorância, que só podia ser colmatada com livros da biblioteca pública ou privada e com documentários que passavam na SIC, ou para os mais sortudos: na TV-Cabo.

Os bonecos deixaram de ter o mesmo impacto. Aliás, julgo que as crianças já nem brincam, preferem passar o tempo em frente à televisão a devorar o mesmo DVD vezes e vezes sem conta ou a jogar no iPad/Tablet do pai ou da mãe. De sair para o shopping em vês de passar uma tardada de bicicleta ou a brincar, nem que seja num quarto de brinquedos.
Neste aspecto tenho de ser sincero. A minha geração, dos anos 80-90, testemunhou a melhor publicidade de brinquedos, que era feita pelo continente com a Lipoldina. Havia brinquedos para tudo!!! Vendiam-se legos muito mais baratos e os action-men compravam-se em separado dos carros, helicópteros e acessórios. Vendiam-se todo o tipo de brinquedos, cada um mais estranho que o outro. Hoje vendem-se mais telemóveis do que caixas de lego.
A falta de brinquedos na vida das futuras gerações irá criar um fosse largo e fundo de sentimentos entre as gerações anteriores; E talvez o mais gritante será a falta de respeito pelos objectos, pois serão tão consumistas e tudo se compra e tem com tanta facilidade que tudo é substituível e de pouco valor. Acrescentando a isso a falta de interacção com as outras crianças, que sempre ajudou a desenvolver a nossa comunicação com os outros. A sociabilização torna-se algo desnecessário ou secundário.
As crianças já não perdem apenas tempo com desenhos animados, o resto da sua infância ocupam-no com actividades físicas, internet e jogos no telemóvel.
Tudo o que têm hoje é apenas vontade de tirar "selfies" e ser sociável. Terem valor na sociedade, sem saberem que as memórias e os momentos "únicos" e especiais irão durar mais que uma foto parva tirada num momento estúpido de "tesão de mijo" ou um jogo no tablet que de nível em nível se repete infinitamente sem criar e desenvolver o pensamento abstracto, analítico e a imaginação.

Li algures, que devido ao elevado uso de internet, a interacção social tem diminuído drasticamente, e que com isso, os jovens e os adultos, por falarem e partilharem-se cada vez menos têm-se tornado autênticas crianças, rabugentas, enervadas e stressadas porque ninguém lhes dá valor ou atenção. Começam então a ter atitudes de putos, exigindo e chorando, tornando-se caprichosas e manipuladoras para seu próprio bem. Só pensam nelas porque ninguém faz "likes" nas suas fotos.
A facilidade de partilhar pensamentos contribui em muito para o amadurecimento de toda a sociedade e do próprio mundo, mas quem sofrerá a longo prazo serão estas e as próximas gerações; Que ao invés de mexer na terra, subir às árvores, brincar com bonecos e desenhar, escrever, ler, vão ser fechados em casa pela sua saúde e segurança, alimentando-se de uma publicidade corrosiva que empobrece e empodrece o pensamento de quem a vê.
Aquilo que as pessoas do "Agora" conhecem, é o que passa nos 4 canais da televisão. E se passa, é porque deve ser verdade, e se é verdade é importante.
Estas novas gerações são mais fáceis de domesticar que as anteriores. Se surgi-se uma nova ditadura, Portugal nunca mais se ergueria de novo, num 25 de Abril.

Uma das coisas que faz falta a esta nova geração e sociedade é precisamente aquilo que já tem em abundância mas que não sabem usar nem explorar. Capacidade de argumentação, de expor os seus pensamentos e emoções, quer por palavras verbais que por escrito.
Esta geração já não escreve nem lê, envia mensagens. Já não faz pesquisas nem se interessa em aprender, vai ao facebook que lá há sempre links com estudos da treta e conclusões duvidosas e inconclusivas.
Frequentam a escola, a única "casa" onde aprendem de facto alguma coisa. Não tem educação, porque os pais não a sabem dar e gostam de dar liberdade aos seus filhinhos porque... "É criança... Está na idade".
A falta de música, nomeadamente a variedade, faz-lhes falta. Se eu tivesse passado toda a minha adolescência a ouvir música de pretos, pop e outras porcarias que passam nas rádios de hoje em dia, de hits (disparos) que nos atingem e furam a capacidade de raciocínio, também eu seria problemático como a geração de hoje. Mas felizmente conheci música que me ajudou a extravasar toda a imaturidade, ódio, raiva e confusão sexual sem ter a necessidade de exteriorizar física e verbalmente sobre outras crianças e adultos.
Tive também desenhos animados, em que 80% me ensinavam alguma coisa e outros 20% tipo dragonball, em que podíamos lutar com criaturas no nosso cérebro.
Havia bonecada para tudo e até com as Barbies brincávamos. Cheguei a aprender a fazer roupa para os meus actions-man, a fazer utensílios e armas.
A minha geração, do pré-1990, teve a maior diversidade em brincadeira e cultura geral que alguma vez alguém teve na história da humanidade. Foi quase uma época de Iluminismo. A década de 90 para quem nasceu na de 80, é relembrada ainda com grande nostalgia.
Nós não nascemos com as coisas já nas mãos, muitos de nós mereceram-nas pelas notas ou compraram com o próprio dinheiro.
No meu tempo a minha mesada era para bolos e brinquedos. Aprendi a poupar, se queria alguma coisa. Não tinha telemóvel e quando o tive raramente o usava; E ainda tinha de ter cuidado com o dinheiro que gastava em mensagens, porque se não sai-me da mesada!!!
Hoje têm tudo de mão beijada. Não lutam nem precisam de lutar por nada do que têm nem do que querem ter.


Mas também existem podres na minha geração. A nossa geração, viu a maior taxa de divórcios de que há história. Uma parte tão sombria como a própria inquisição, o que explica o excesso de liberdade que os papás, filhos de país divorciados, dão hoje aos seus. Como não tiveram "amor, carinho e atenção", mas tiveram as maiores regalias por serem comprados por cada um dos pais para que o filho gostasse mais de um que do outro, hoje esbanjam e mimam de forma aberrória os seus filhinhos queridinhos, que não têm culpa, que "estão na idade" ou "é da crise".
Se não querem, não os tenham. Mas também não adoptem por amor à sociedade decadente e em apodrecimento de cultura.
Têm acesso a tudo, menos a inteligência a maturidade.

Não sabem estar, não saíam se casa!