domingo, 20 de abril de 2014

Adoro ouvir-te, ver-te e cheirar-te... [7]



As raparigas passaram e atrás um casal. Ele olhou para ti, rapidamente, como quem observava um incêndio à distância e com um puxão forte, a mulher agarrou-o pela orelha, séria e rabugenta, como só as mulheres pobres de espírito sabem fazer. Senti o teu desconforto perante aquela situação. A cabeça baixa e uma expressão triste muito imperceptível ao olho destreinado. Julgo teres sentido pena pela relação. Não pelo homem mas pela mentalidade amacacada desta sociedade porca, nojenta e horrivelmente ignorante. Olhaste a tua pequena com um sorriso e ela sorrio. A tua atenção voltou-se de novo para as meias altas. Pegaste numas cinzentas muito bonitas com um toque de sensualidade e suavidade. -- Tens bom gosto! -- Comentei para mim mesmo, que te olhava da loja da frente, de decorações de interior, vezes sem conta como um apaixonado.
Não viste o preço e pegas-te nas meias pretas do teu número. De forma natural pedis-te de mão e braço esticado a mão da tua filha, levando-a contigo até à rapariga nova que te atendeu com um sorriso grande e energético, muito diferente daquele que ela me costuma dar a mim. Julgo que não é lésbica, e a maneira como olha para os rapazes da idade dela na loja, demonstra que não tem inveja daquilo que entra por aí. Será por seres daquele tipo de gente com que toda agente sonha ser um dia? Presumo. Significa que falta algo na minha imagem. Tenho de tratar disso...

Compras feitas, sais-te de mão dada, saltando os olhos de montra em montra, até chegares à Bertrand, onde deixas-te à solta a piolha que numa correria desenfreada se atirou aos livros infantis. Segui-te, entrei e desfolhei alguns livros.
-- Joana! -- chamas-te num tom de aviso, tendo como resultado um ligeiro olhar rebelde. Joana? Nome de mulheres guerreiras. Pergunto-me se foi escolha tua ou do teu marido.
Debruçavas-te entre as estantes de Esoterismo e Psicologia, parecendo interessada em livros sobre crianças e auto-conhecimento. Tens bom gosto em roupa, lingerie, nomes, livros, que mais? A tua voz era incrivelmente aconchegante mas feminina o suficiente para te imaginar debruçada, de quatro, à minha frente. Aproximei-me do teu corpo e senti o teu cheiro. O perfume "Amor Amor" inundava-me as narinas de hormonas que me faziam o corpo vibrar. És sem dúvida uma num milhão! E esse cabelo loiro, que se mexe a cada olhar vigilante sobre a tua mais-que-tudo, lembrava-me uma dança de amor, que me fazia apaixonar cada vez mais pelo teu corpo pálido de sangue azul. Não era o momento certo para te abordar. Precisava de uma estratégia para te impressionar o suficiente a me deixares entrar no teu espaço de conforto e no de protecção no qual deixavas a tua filha, Joana.
Ela gosta de livros de desenhos, talvez tenha alguma personagem preferida ou algum filme de desenhos animados, e tu gostas de temas que abordem o interior de ti própria. Li recentemente alguns livros interessantes, talvez te interesse o suficiente para continuares a conversa. Coisa que poderá ser difícil, porque mulheres como tu não gostam de perder muito tempo com homens sem nada de interessante para dizer. Tenho de arranjar algo sofisticado mas simples. Fácil de compreender e de desenvolver. Mas antes que pudesse construir alguma coisa na minha cabeça, era altura de sair dali caso fosses sair. Não te queria perder por nada no meio desta multidão desorganizada e barulhenta; E sair contigo iria dar a entender que te andava a seguir.
Num ligeiro impulso, a minha mão tentou segurar-te na anca. Conti-me devorando-me por dentro, segurando com força a besta que te cobiçava a curvatura do teu rabo e as tuas mamas. No meu cérebro libertou-se um sentimento físico de falsa posse. Naquele momento desejei que fosses minha mulher, para te puder agarrar, apalpar e beijar. Ao sair, olhei-te para os tornozelos, esses saltos altos ficam-te mesmo muito bem!

2 comentários:

  1. (Pegando numa resposta que me deste num texto mais atrás...) Mais uma vez me vi fascinada pela forma como construíste este mundo. Esta obsessão doentia do homem perante a figura feminina. Não me assustaste porque para isso seria preciso estar a viver o momento. E bom, até vivi o texto mas na minha mente, como um espectador. Sabes, seria interessante trazeres para esta história a perspectiva de alguém que observa este homem, os seus movimentos. É que, incrivelmente, cruzamo-nos com pessoas assim todos os dias e raramente, muito raramente, nos apercebemos das suas reais intenções. De que forma eles conseguem disfarçar os seus intentos? Lá está a minha "obsessão" por saber sempre mais e mais.

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    1. Eu não sei como se irá desenrolar a história apesar de ter alguns pontos chave que quero abordar. Introduzir um espectador não faz parte desses planos.
      Como disseste: "até vivi o texto mas na minha mente, como um espectador." Tu és a espectadora. És o meu alvo. E há muito mais escondido nesta história do que parece.

      Tens razão, é um obsessão "doentia". Mas não podes contar a ninguém. Se todas as histórias são pequenas "auto-biografias", há delas que podem ser perigosas.

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