sexta-feira, 27 de julho de 2012

O que não me sai por vergonha...


Pousei os livros no tapete rolante e desfolhei o primeiro. Imagens de aves captaram-me a atenção, mais abaixo vi um conjunto de bicos e a sua funcionalidade.
Era a minha vez de ser atendido. Olhara para ela muito pouco, mas os cabelos eram escuros ondulados e compridos, alta, magra e com um relógio laranja na mão esquerda. Não tinha anéis.

Numa introspecção rápida, mais tarde, percebi que a cor do relógio demonstrava ser uma rapariga com uma mente jovem, muito simples, menina, não significando que não era psicologicamente madura.

Olhei-a nos olhos e fiquei envergonhado. Ela não podia ver, mas acredito que talvez sentisse. Deslumbrei-me com a sua cara. A sua beleza, simples, de rapariga, com aqueles cabelos compridos e uma altura invejável. Apaixonei-me um pouco, como um tolo. Queria dizer qualquer coisa mas não sabia, nunca soube, agir. E o que iria dizer? Como?

Quando me devolveu o cartão de crédito, o qual viu e reviu à procura de um nome, eu sei que sim, segurei-lhe na mão e disse:
-- Não tenhas medo em ficares vergonha, corada ou sem saber o que dizer, mas eu acho que és uma rapariga incrivelmente bonita!
Ela olhou para mim muito pasmada e a sua cara ficou vermelha. Segurou o cartão enquanto tentava manter a compostura.
-- Obrigada. -- responde ela, olhando para mim durante uns segundos, desviou olhar rapidamente para as teclas à sua frente e preparou-se, tentou, para atender o próximo cliente.
Atendeu o meu irmão, e eu fiquei ali, enquanto ele se apercebia interiormente que ela estava nervosa.

Eu sabia que ela tinha sentido qualquer coisa. Revejo o sorriso dela, vezes e vezes sem conta, pensando para mim a figura de totó que tinha feito, só lhe fui capaz de dizer "Obrigado"? E ainda por cima com o cabelo "todo" à frente da cara? Que figura... mal me deve ter visto os olhos, ou sequer a cara... muito menos o sorriso, suponho.

Será que perdi a oportunidade?
E se ela já tivesse namorado?
E se não tiver, mas não quiser nada comigo? Ter-me achado simplesmente "interessante"?
Talvez ela tenha sentido que sou demasiado velho ou que queira coisas que ela não pode dar.
-- Só saberás se perguntares. -- sim, frases feitas também eu as sei.
O intuito aqui, é partilhar, não para vocês, mas para mim. Para um futuro. É difícil pedir um nº de telemóvel sem se ser demasiado exibicionista. É difícil pedir de forma simples, bonita e meiga. De maneira que não assuste nem afugente. Para mim é, porque sou naturalmente envergonhado, principalmente quando me sinto atraído por uma rapariga como aquela.
Não sou de namorar com tudo, de me atirar a todas, as feridas custam e demoram a passar. E como já referi noutros textos, quando me agarro, é para sempre ou até que ela me deixe. Não se namoros fáceis, rápidos. Sou de dar a mão e permanecer ao lado, mesmo que me chateie ou me magoe. Não sou um cão abandonado, sei ser. Oh... agora sei ser. Pensar em tudo 3 ou 4 vezes, e não em apenas 2 ou 3 sem ver realmente o quadro todo.

O que não me sai por vergonha... são acontecimentos que não me fazem crescer mais, que não me ensinam, que eu não mudou. São momentos em que eu não tenho qualquer impacto, não altero nem intrigo. Torna-se passageiro e ao fim de um dia ou dois, esquecem-se de mim e da minha cara. Que é possivelmente o que vai acontecer com ela quando chegar a casa e procurar pelo meu nome, caso o faça. Apercebe-se então que se esqueceu do nome, pior ainda não sabe de onde sou... houvesse uma maneira de nos encontrarmos ou de comunicarmos, e talvez, talvez, pudesse surgir uma amizade.
Porque... só pelo simples facto de eu ter comprado 7 livros de uma colecção de animais, que ela fez o prazer de passar pelo código de barras um a um, talvez se tenha interessado um pouco em mim, naquilo que eu gosto, naquilo que vejo ou leio. Na pessoa que sou por trás dos cabelos compridos que me cobrem a vergonha estampada no rosto. Sim, talvez tenha causado um impacto, por muito pequenino e efémero que tenha sido. Talvez um dia mais tarde nos encontremos, eu me lembre da sua cara e ela da minha, e... se houver tempo, conversarmos.
Mas que digo eu? Estou a sonhar, mas às vezes sonhar é bom. Ás vezes? SEMPRE!
Sonhar mantém-me criativo, as emoções psicológicas, físicas e a sensibilidade mais apurada. Se eu não souber chorar pelo que me faz feliz, não mereço ter alguém do meu lado.
Tenho epifanias, momentos de deslumbro quando vejo um documentário e junto os pontos de algo que já tinha visto antes. Fico pasmado a olhar para o ecrã, a sentir as lágrimas escorreram-me pelo rosto, de tão incrível que é sentir essas epifanias, momentos de heureca! É como olhar para o universo na noite mais calma, com o céu limpo no topo de uma montanha, deitado e rodeado pelos nossos pequenos filhos. E contar-lhes as histórias dos navegadores portugueses que descobriram o mundo através delas. Mostrar-lhes as maravilhas do universo, da natureza num momento único da nossa mais profunda paixão de curiosidade.

Paula Brito e Costa da empresa Raríssimas disse uma vez numa reportagem da sic algo parecido com isto quando lhe perguntaram se pensava mal dos pais que não conseguiam ou não tinham forças suficientes para ajudar os seus filhos "deficientes", enquanto que outros conseguiam:
Há pais que conseguem, há outros que não.
E a que é que isto vem a propósito? Não somos todos iguais. Bem, estatisticamente existe muita gente igual a muita gente, caso contrário não havia modas. O que eu quero dizer com isto é que existem pessoas que são boas numa coisa, e "más" noutras. Mas não significa que não tenham valor. Deixámos de dar valor ao que nos torna humanos para passar a dar valor a pessoas?

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