domingo, 21 de outubro de 2012

Tenho saudades...


Sento-me sobre a cama, encostada às almofadas, aconchegada nos lençóis. Apago a luz e sou engolida pela triste e solitária escuridão. Apenas o ponto vermelho da minha televisão me faz companhia, no negro que me magoa mais do que a solidão de mim próprio. Porque me deito sozinho... não existe ninguém para me ouvir, para me olhar, para me cheirar, beijar, abraçar. Ninguém com quem descansar e partilhar o meu calor.
Tenho saudades de sentir as mãos pelo meu corpo, de o nariz me farejar o pescoço, e os lábios tocarem-me o ombro com um beijo de flor. Delicado. Saudades de ser acolhida e recolhida. Protegida e encaminhada.
Saudades de sentir a força do incentivo nas palavras de quem me ama mais do que tudo. Saudades de sentir ciúmes por todas no geral, e me sentir amada em particular.
É ao olhar para este vazio, este quarto sem cor e sem objectivos de vida emocionais e amorosos, que eu deixo sair uma lágrima. O meu corpo treme debaixo do frio gélido e enrosco-me sobre mim mesma, num aperto forte de cobertores e almofadas. Um nada que me aquece. O único nada com quem vou viver para sempre. Não quero! Nem sou feia... sou até bem constituída, bonita, cabelo ondulado  Sei ser sexy, inteligente e sedutora, mas ninguém quer uma rapariga que saiba falar, que saiba ser, que seja inteligente e fale do que ninguém goste de falar.

As coisas boas parecem estar ao virar da esquina, e só preciso de decidir que caminho escolher. Mas depois de escolher, de lutar, a única coisa que vem é uma mão cheia de nada. Uma carta endereçada a mim, sem letras, sem tinta, sem selo, sem origem. Esperava um sorriso, um objectivo concluído ou um caminho novo para seguir, para me erguer, para tentar de novo. Mas o "novo" e o "erguer" não fazem parte da minha vida, aparentemente.
A única coisa que me foi ensinado, e talvez a única coisa que realmente é importante, mais do que estar sempre a ganhar, foi levantar-me de cabeça "erguida", cada vez que cair ou errar. Mas eu não quero estar sempre a errar. Eu quero ganhar à primeira, uma vez na vida. Não é só uma, são várias.
Quero poder realizar aquilo que quero. Mas a minha realidade é que desde pequeno que nunca realizei tudo o que quis e sonhava. Nunca pude. E tal como já escrevi, sempre fui obrigado a ver os meus desejos, sonhos e vontades serem rasgados pela minha incapacidade, e pela incapacidade dos meus pais de os "realizarem". Tenho de ser sincero e dizer que fui "feliz", que tive, fiz e vi coisas boas, mas o que mais me faltou foi a satisfação pessoal. O poder de controlo na minha vida nunca existiu. Faltou, sempre faltou, a capacidade de realizar, o poder de conseguir realizar algo. De facto chegar ao fim, de obter algo.
Não, nunca houve, e este ano pela primeira vez acreditei que conseguiria mudar isso, mas não... tudo ficou na mesma. Na mesma merda que era e estava antes. Acho até que ficou pior de uma certa perspectiva  Não tenho controlo em nada.
Sabendo eu não ser o único, só posso ter pena de vocês. Só posso dizer como já me disseram a mim em tempos: "Se caíres 7 vezes, levanta-te 8".
É um olhar para trás, para a minha vida, e ver uma criança feliz, mas que nunca alcançou nada na vida. Uma criança que nunca teve nada, que nunca concretizou um sonho. Uma criança que compreende, que por não ter mais, e por ter tido mais, não é mais do que ela própria já o é. Que por não ter, e saber quem pôde e teve, a inteligência na equação é só uma pedra na praia. Um rapaz que tem consciência de que não é nada nem ninguém.
Fosse eu mais rico, ou tivesse a mais dinheiro, e faria hoje o que sempre me deu mais vontade de explorar, de fazer e ver. Mas eu não tenho... e é por não ter que não evoluo. É por não ter, que a minha mente se encolhe, como encolhe o dinheiro no meu bolso.
É por eu ter consciência de que não tenho dinheiro, que o meu cérebro entra num estado de puro negativismo. Onde o meu ego deixa de ser ego para passar um poço de lamurias. Mas tal como vi numa série, é por eu me sentir parado e sentir que toda agente à minha volta anda para a frente, que eu posso realmente fazer alguma coisa, com esse tempo em que estou "parado".
Mas se não tenho motivação... se não tenho objectivos que posso realmente olhar de frente e acreditar que podem ser realizados, porque nunca tive nenhuma experiência positiva, como poderei levantar-me de novo?
Vou ficar à espera? Do quê? Que o mundo avance? Vou caminhar para onde e porquê? Tivesse eu tido essa educação em casa... e tudo seria diferente. Tivesse eu tido uns pais com mais dinheiro... tive eu tido uma educação diferente... e todo o negativismo não existiria. Nem as hesitações, nem os medos, nem as preocupações. Mas não tive, e talvez seja esse o objectivo. Porque talvez saiba dar valor, e o negativismo não me afecto tanto como a outras pessoas.
O meu pai disse-me uma vez que nos preparou para falhar-mos. Que nos educou para lidar bem com as coisas más, com a perda e o negativismo. E é isso que tenho de bom para passar aos meus filhos. Pois enquanto eu sei dar valor, e lidar com as coisas más. Porque compreendo a tristeza e a alegria, porque não paro de caminhar durante 18 km seguidos na encosta da serra da estrela nem que me doam as pernas e os pés, que os meus músculos gritem por uma pausa, eu tenho mais resistência que muitos e muitas. Porque a resistência psicológica trouxe-me até aqui, pelos bons e maus momentos, como disse uma vez ao meu pai, temo-los, nós, a nossa família, porque sabemos lidar com eles. E dinheiro não compra isso. Estudos não me dão isso.
No fundo de tudo, sei mais do que alguém com dinheiro, existem excepções e há dias tive uma prova de que tais pessoas existem, pelo lado positivo. Mas faltará algo em todas elas. Um algo que vejo foscamente. Uma auto-educação. Uma auto-consciência. E pensem o que pensarem, narcisista já sou há muito.
Reconheço uma falta de consciência familiar e educacional. Falta-lhes a capacidade de se envolverem e dialogarem num algo negativo, num algo depressivo. Num algo sem vida. Uma consciência que parece fugir de muita gente. Têm tudo e são os melhores, mas têm sempre defeitos.
Qual é então o meu defeito? Errar demais? Esforçar-me de menos? Ser malandro? E que preocupações tenho eu nesta fase da minha vida? Tenho muitas, é verdade, mas não tenho nada que realmente me preencha o calendário.
Quais são os meus defeitos?
Talvez deva perguntar de outra maneira... O que me falta? O que me faz falta? O que devia fazer mais? O que posso fazer mais?
Eu faço as perguntas correctas, dou as respostas acertadas, mas será que as vivo?
Será preciso mais um susto? Ou mais um daqueles momentos em que consigo controlar a minha vida? Um momento que me volta a dar ânimo, que me volta a dar forças e garra, que me volta a colocar um sorriso na cara e uma força de vontade que me surpreende?

Tenho saudades daquilo que nunca tive... e tenho medo que nunca venha a ter.

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