sexta-feira, 26 de outubro de 2012

O meu grito chora...



Solto um forte grito, que me rasga o peito, no meio daquela floresta molhada. Um grito que me enche de raiva as mãos de punhos fechados. Sinto as unhas penetrarem-me a pele. O meu corpo treme.
O som deste meu choro, desta minha morte lenta, enrijesse o peito que tanta força tem para se fazer ouvir. Mas ninguém me ouve, porque não quero que ouçam. Ninguém sabe, porque não quero que saibam.
O vento atravessa-me com força, sem piedade sobre o meu corpo nu. O grito não ecoa, porque ninguém quer perpetuar o sofrimento. Não ecoa, porque ninguém quer ouvir a dor que me faz fechar os olhos. Os joelhos caem no chão, as minhas mãos enterram-se na lama e nas folhas mortas, enquanto uma chuva de largas gotas me apedreja as costas pálidas. Contorcem-se das chicotadas, e fazem surgir rios vermelhos, montes que me parecem subir pelas costas, fustigadas e inibidas da perfuração. Uma tortura que me afoga na frieza do meu sorriso, na rigidez da minha expressão, do temer pelo bem da minha alma quando os trovões caem com força à minha volta.
Trovões que parecem brincar, tiro ao alvo, e eu... o centro, o grande ponto vermelho, magoado e pálido que não sabe o que é sorrir nem sentir um abraço. Que nunca partilhou um beijo, um entrelaçar de dedos ou  a almofada.
Um Eu que não tem um diário e cujo o único amigo é ele mesmo. Estou farta do sono que não traz a morte. Triste da solidão que não me traz uma companhia. à minha volta não existe um mundo, existe um buraco fundo e profundo que me espinha e me calca.

As lágrimas salgadas brotam dos olhos em fogo, os meus peitos parecem cortar-se, e a brisa agarra-se, querendo levar-me a pele que me reveste.
Caio ao chão, virada para o céu cinzento, negro como o meu quarto se torna quando lhe fecho a porta, as janelas e as persianas. Os trovões iluminam a madrugada fresca, como flashes de memórias que vivem na minha mente. O rugido das suas gargantas estremecem o chão, faz as folhas caducarem em plena madrugada de primavera, e embala a minha pobre carcaça sem cor, sem força, sem desejos nem vontades.
Um olhar morto que se lança aos céus, à espera que seja levado para outras paisagens. Lançado ao mar de pólens que fustiga o mundo de irritações e constipações.
Desejar a morte arrastar-me enforcada, por entre a vegetação que nunca viu alegria. Vida. Uma vegetação negra e empalhada de folhas moribundas sem cor, sem emoção que espelho na minha consciência inexistente. Engolida pela solidão das cascas que viveram com a Lua tenebrosa, de um sol inconstante. Aprisionada e fechada em mim, num Eu que não me pertence. Sem companhia, num bosque que explode de vida.
Afogada nas lágrimas, em gritos surdos, mudos, de gestos violentos sem força para me erguer. O meu grito de Vida abandonou-me acompanhado pelo grito de Guerra.
Estou sozinha como vim ao mundo, despida de afectos e carinhos, de toques delicados e perfumada pelas flores. Sem amor nem humor.

O meu grito chora... sente a falta, tem saudades e sonha longe. Vê sorrisos e carinhos, em gestos simples. Um sofrimento profundo que me faz perder a esperança. Que me faz desesperar.

O meu grito chora... e eu choro com ele.
-- Estou aqui, contigo.

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