A chuva batia na janela com força. Parecia que alguém do outro lado me gritava para ir até ela, ver a natureza do vento torcer os ramos das árvores e a fúria da água ensopar os jardins e matar os canteiros. Aquele som picado, trespassava a janela. Já não eram gritos, eram murmúrios acompanhados por grandes relâmpagos que rasgavam o céu negro, pesado, sombrio e obscuro.
A criança tremeu dentro de mim, à medida que me aventurava até à janela. Senti o cheiro da terra e da água nas tábuas velhas da janela. Senti um frio percorrer-me os pêlos dos braços e dançar nos ossos das minhas costas. Arrepiei-me e um relâmpago desfez o chão. Os tambores ressoaram pelo quarto, pelos meus ossos e ouvidos. Caí no chão ao lado da cama, e sem tempo para me acalmar, a escuridão transforma o meu quarto. A luz falta, ninguém está em casa. Sinto-me sozinha...
Entre as nuvens, aparece uma Lua pálida de morte. O forte brilho tornou-se meu companheiro, meu amigo. Uma personagem imaginária, sem cara ou voz. Que zela por mim, pelo menos por enquanto...
Os grossos lençóis forram-me as pernas geladas, as almofadas protegem-me do desconforto dos relâmpagos e assim fico, deitada, neste quarto vazio e despido. Aperta-me nas mãos, não o frio, mas a saudade do calor; A saudade de não ter, mãos que me aqueçam os dedos presos e o coração apertado. Quase consigo associar os raios a memórias difíceis, a tristeza que tento esquecer, em vão, de um passado que me é todos os dias presente e não sai, não acaba, não expira. As lágrimas da saudade, da pena de não ter na cama mais uma fonte de calor e um grande abraço para me aconchegar como me fazia a mamã quando eu era mais pequenina... brotam e deixam a marca de um pensamento que temo ser real, que se torne verdadeiro, em mais um sapo e num momento difícil onde certamente irei tropeçar, rasgar as calças e ser gozada.
O tempo acalmou e faz agora dançar o seu som nos meus ouvidos.
A natureza cortou-me a comunicação. A minha língua não mexe, apenas gagueja. O meu corpo não respira, não trabalho. Fechou por motivos que desconheço e que já não sonho. Esqueci ou afastei dele, daquela pequena maça cinzenta que me pesa na testa, a realidade. Já não lembro nem penso. O piloto automático controla o medo e faz trabalhar os membros enferrujados, esquecidos, como as palavras que posso apenas ler. Ouvir? Fechou-se longe e lá se mantém até que o traga de novo pela mão, prometendo pela viagem, um grande doce e um carinhoso beijinho.
Quero ser amada de novo, agarrada com força e sentir nas palavras, o que tenho medo de nunca vir a ter.
Não quero que este dia acabe, a chuva faz-me companhia.
Quero ser amada de novo, agarrada com força e sentir nas palavras, o que tenho medo de nunca vir a ter.
Não quero que este dia acabe, a chuva faz-me companhia.
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