Cada passo me aproximava mais da entrada guardada por dois vultos encapuçados. O chão liso reflectia a minha figura de forma desfocada e o vidro fosco pintava-se de branco. O corredor pintado de leite, apertava-se sobre mim, pesando nos ombros como um arrependimento agudo. A consciência ficava para trás, deixando-me em piloto automático, incapaz de delinear uma ideia sobre o que estivesse no fim daquela caminhada iluminada. Era quase como se o mundo termina-se naquele rectângulo impenetrável pela minha mente, e me fizesse entrar numa dimensão irreconhecível por todos os sentidos evolutivos que me trouxeram até aqui. Sentia em mim mesmo, a estranha sensação de que o que quer que eu fosse, de onde quer que eu tenha vindo, a evolução de uma espécie, não faria o menor sentido ali dentro. Como um caracol que rasteja pelo chão sem nunca vir a saber onde se encontra.
Os vultos, rapidamente se confundiam com o preto pesado dentro daquele hall de entrada, desaparecendo por completo a já escassos metros, acabando por serem trocados pelo som forte de chuva a cair. Nos vidros bateu uma rajada de vento, seguido de um grande tufão. Perante uma fuga irracional que fervilhava sobre os meus pés e pernas, olhei o interior receando o desconhecido. A violência no exterior, para lá das janelas que escondiam o perigo sem rosto, entrava tocando os trovões pelas minhas costas, fazendo desenhar na minha imaginação um comboio em rota de colisão. O corredor tornou-se cinzento, as suas paredes racharam em fissuras sugerindo tijolos velhos que acabariam por desaparecer numa escuridão infinita, sem tecto ou chão. A parede à minha frente, levemente como o bater de asas de uma borboleta, transformou-se num céu estrelado, aproximando-se depressa de uma grande nuvem dourada de pós de estrelas.
Um arrepio cerebral efervesceu no meu peito, deslumbrou-me a mente. Fascinou-me. Conquistei o espaço em volta com o meu olhar e percebi então o segredo daquele quarto misterioso no momento em que os dois vultos voltaram a aparecer diante de mim.
-- Não posso fazer mal, pois eu não sei o que é. A vida é apenas uma visão. Um sonho... Nada existe. Um espaço vazio, e tu... não passas de um pensamento.
-- Não posso fazer mal, pois eu não sei o que é. A vida é apenas uma visão. Um sonho... Nada existe. Um espaço vazio, e tu... não passas de um pensamento.
-- Bem vindo à fronteira. Aqui começa o que o teu pensamento se torna incapaz de ver. O universo é infinito enquanto o teu pensamento o conseguir visualizar e lhe der um significado.
Somos um intervalo no tempo que não avança e o espaço que não existe.
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